terça-feira, 11 de agosto de 2009

Sorria: você está no shopping

Na minha frente está sentada uma gordinha, sozinha, comendo batata frita, uma-atrás-da-outra. Pensei: um dos meus livros de auto-ajuda poderiam auto-ajudá-la.

Alguns casais felizes se beijam e mastigam. Outros vieram à procura de algo que os faça esquecer do casamento infeliz: comida, sapatos ou um flertezinho, quem sabe.

No cinema, a fila mais longa e com mais pais levando filhos é a de um filme com robôs e metralhadoras.

A senhora da limpeza continua varrendo e limpando mesas e cadeiras de um mundo do qual ela não faz parte, a não ser da parte que lhe toca – limpar o chão. Com um gesto mecânico joga no lixo mais um copo estampado do McDonald´s.

Me impressiona a quantidade de gente que ainda opta pelo McDonald´s. Pais e filhos compartilhando química alegórica .Acho que quem come no McDonald´s perde a elegância. Como o cara engravatado e de cabelo jogadinho, da moda, segurando aquela caixinha com a alça em forma de “m”... Ele pega agora um bichinho verde que veio no lanche feliz. Aperta e chacoalha. Balança a cabeça negativamente pra esposa, decepcionado: acho que o bichinho é só isso mesmo. Não faz barulho, não faz nada.

Há dois rapazes um pouco mais adiante. Sentados de frente um para o outro conversam cada qual no seu celular. Não é estranho?! Por que se encontram se falam com pessoas que não estão presentes?

Tudo é auto-explicativo, as setas indicam banheiros, saídas e entradas, cartazes muito coloridos estampam os pratos anunciando promoções imperdíveis. Tudo fácil, prático e mecânico. Tão mecânico que não se olha mais pra moça do caixa e nem ela olha mais pra gente. A fila anda. Tem que andar. Linha de produção tem que ter falha zero e tem que ser just in time. Já pensou parar pra perguntar como vai a saúde da moça? Seria desastroso para o sistema. Além do mais, não está previsto nos manuais de atendimento de excelência. O mais indignante é como o ser humano se adapta facilmente a esses padrões.

Tem um guri do meu lado, rodopiando na cadeira giratória. Ele pergunta pra mãe: “que foi, mãe, parece que não tá feliz? Cê tem que sentar na cadeira da felicidade!” A mãe senta na cadeira ao lado e vira pra lá e pra cá mecanicamente e dá um beijo no filho. A cena emocionou. Um pouco de humanidade num ambiente tão forjadamente artificial.

Seguro forte o livro que vim buscar e saio correndo dali. Lá fora, respiro fundo o ar ensolarado e olho o céu azul, folhas caem das árvores, um senhor passa assoviando, um casal toma mate na praça, um rapazinho desenha. Ali adiante, um senhor de chapéu toca violino. Sento-me ao lado e o alívio percorre as veias.

***

Esta crônica foi escrita pela Liesel e reproduzo-a aqui a pedido dela.